segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Vida breve

Steve Jobs morreu. E como esperado, foi o assunto da semana. Suas frases e lições foram compartilhadas pelo mundo inteiro. Eu, por exemplo, compartilhei seu discurso em Stanford e também um vídeo muito bacana em que ele diz que "computadores são como bicicletas para nossas mentes". Também algumas críticas foram ditas sobre a influência de Jobs no aumento do consumismo, mas nada que fosse capaz de diminuir sua genialidade. Ele comentou sobre uma frase que o fazia questionar a si mesmo todos os dias: "Se você viver cada dia como se fosse o último, algum dia você certamente estará certo." Uma frase com o sentido já tão conhecido...


Na noite de antes de ontem eu tive um sonho, que pode parecer um pesadelo no primeiro momento. Mas não é.
Eu ia morrer.
Meu namorado, minha família e meus amigos sabiam. Eu sabia.
Eu deveria morrer naquele mesmo dia, no qual eu tinha tomado um remédio que me tiraria a vida, assim como as dores de uma doença que eu havia desenvolvido.
Eu deveria morrer naquele mesmo dia.
E naquele mesmo dia eu deitei um pouco e quando me levantei senti que ia morrer mesmo. Me vi morrendo. Mas não. Levantei e continuei o dia.
Quando eu desci o elevador, familiares estavam lá embaixo para checar se eu chegaria viva. E eu cheguei. Mas no dia em que eu ia morrer, eu só queria ficar sozinha. Era minha morte, meu momento. Eu tinha esse direito. Eu não estava triste, sentia algo de missão cumprida.
A morte me pareceu conveniente.


Sábado a noite resolvi terminar um livro, daqueles que a gente para de ler justo no final. Uma certa culpa me impedia sempre de terminá-lo - assim como outros que mantenho em minha cabeceira -, haja vista a turbulência da minha vida, catastrófica. Me rendi, mesmo assim, ao conto no qual havia parado: Primavera de luto.
Ao ler uma frase da protagonista, foi como se as ideias que pipocam na minha cabeça e nunca antes exteriorizadas, tivesse se tangibilizado. (Fui clara?)
"O corpo, o corpo, a única coisa de que somos proprietários; a inteligência, a alma, é produto do olhar dos outros."


Sempre gostei de usar óculos escuros. Sinto-me como se a lente me protegesse da visão raio-x dos outros seres que me encaram como se eu fosse uma ameaça. Mas só quando os uso. Ou sou vulnerável. Se um vendaval fosse capaz de destruir tudo ao meu redor, os óculos provavelmente me protegeriam. Formariam uma cápsula protetora à minha volta. Caso contrário, eu iriar levantar vôo. Me imagino no meio de tufão como naquele filme Twister. Ai. Nostalgia.
Também no conto em que li há um trecho importante a ser descrito aqui:
"Elena sempre havia desconfiado das pessoas que usavam óculos escuros, considerando que quem precisava esconder os olhos do resto do mundo carecia da destreza necessária para ocultar as próprias intenções de outro modo. Com Luis, seu marido, às vezes brincava de desvelar o caráter desse tipo de pessoa:
- Veja este - dizia - , ele usa para olhar à vontade as mulheres. Mas não esconde nada, exceto uns olhos de pássaro.
- Mulher - respondia Luis, condescendente -, há quem use óculos escuros para se proteger do sol.
- Para isso existem as sobrancelhas. E os cílios."


Elena me ensinou a cuidar dos meus lábios, pois é por eles que as mulheres envelhecem.


O conto Primavera de luto está aqui:
Millas, Juan José. Contos de adúlteros desorientados. Rio de Janeiro: Ediouro, 2005.